segunda-feira, outubro 17, 2005

Entrevista não é conversa

Hj à tarde, lendo material de arquivo jornalístico para a tese, li algo que pode interessar a muitos. Trata-se de uma historinha sobre uma matéria da folha em que os jornalistas Getulio Bittencourt e Haroldo Cerqueira Lima, sem gravador e sem papel, conseguiram redigir uma a entrevista bombástica com ex-presidente João Figueiredo. Detalhe, os assessores do ex-chefe do SNI ligaram "p da vida", quando leram a entrevista na Folha. Acusavam os jornalistas de o terem gravado escondido. Legal, né. Os caras ganharam o prêmio Esso. Abaixo a história:

" Ministro-chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), Figueiredo se preparava para suceder ao presidente Ernesto Geisel. Recebeu os jornalistas às 16h40 do dia 4, em seu gabinete no Palácio do Planalto. Logo de cara, avisou: "O que nós vamos ter aqui é uma conversa, não uma entrevista". Os repórteres, se quisessem, poderiam relatar o diálogo no jornal. Só que não podiam anotá-lo nem gravá-lo.

Na manhã seguinte, a primeira manchete _"Exclusivo: fala Figueiredo". No dia 6, a segunda: "Privatizar é tarefa difícil". Dividida em duas partes, a "conversa" com o general se estendeu por um total de quatro páginas. E saiu na forma de "pingue-pongue" (perguntas e respostas completas). Quem leu tudo experimentou, sim, a sensação de uma entrevista _informativa, dura e franca, em que Getulio e Haroldo não raro discordavam de Figueiredo.

Assessores do militar não gostaram nada de ver o general retratado de maneira tão crua. Telefonaram de imediato para a direção da Folha. "Não questionavam o conteúdo da conversa, que expressava exatamente o que ocorrera no encontro, mas diziam que os repórteres haviam enganado Figueiredo, que o gravaram às escondidas", lembra Boris Casoy, 60, o então editor responsável do jornal. "Acontece que Getulio _um jovem promissor de 26 anos_ transcreveu as frases de memória, com uma precisão assombrosa." Batia os trechos à máquina, e Haroldo ia conferindo.

A façanha _que rendeu à dupla o Esso de Jornalismo, o principal prêmio da categoria_ soa mesmo inverossímil. A entrevista somava 111 intervenções dos repórteres, contando perguntas e contra-argumentos. Extensas, algumas respostas de Figueiredo incluíam vários números.

"Acredite: realmente reproduzi a conversa de cabeça", sustenta Getulio, 49, mineiro de Tarumirim, que hoje edita o site "Panorama Brasil". "Desde menino, treino muito a memória. Já cheguei a decorar a filmografia inteira do diretor John Ford, com mais de cem títulos. Sabia o nome dos atores, dos roteiristas e dos músicos de cada produção."

2 Comments:

At 9:08 PM, Anonymous Anônimo said...

Por ser crédula e acreditar que ele tem mesmo uma memória boa, eu fiquei triste com essa matéria.. Eu tenho uma memória péssima.... Não guardo nomes das pessoas, quanto mais numeros!!!
Droga... Se um dia eu fôr entrevistar um presidente com certeza, levo um gravador escondido!!

 
At 6:15 PM, Blogger Fabio Malini said...

Luisa, tranquila, já tem remédio para isto...

 

Postar um comentário

<< Home